ABA – Associação de Bioenergia Avançada
Agosto 7, 2023
A EcoMovimento é uma empresa especializada em operação e gestão de resíduos, nomeadamente, de óleos alimentares usados (OAU), refinando-os e encaminhando-os para a indústria do biocombustível.
Falámos com Hugo Rocha, gerente da empresa, que nos fala sobre um mercado paralelo que pode estar a crescer neste setor.
Analise brevemente o setor da recolha de óleos alimentares em Portugal.
Os óleos alimentares usados são produzidos em três setores distintos: HORECA (hotéis, restaurantes, cafés, etc.), industrial e doméstico (habitações). Os OAU produzidos nos setores HORECA e industrial são maioritariamente recolhidos. Os OAU produzidos no setor doméstico apresentam índices de recolha baixos pois há muitos Municípios que não disponibilizam uma rede de recolha de OAU para os cidadãos, contrariamente ao que está previsto por lei.
Portugal está munido de um número suficiente de bons Operadores de Gestão de Resíduos que fazem esta recolha e acredito que a capacidade logística instalada em Portugal, atualmente, é suficiente para tratar todo o OAU gerado nos diversos setores.
No imediato, parece-me urgente redefinir a legislação aplicável aos OAU por forma a profissionalizar o mercado da recolha e incrementar os índices de reciclagem deste resíduo.
Como tem visto a evolução deste setor, em Portugal, nos últimos anos?
Em Portugal, apercebo-me que os Operadores de Gestão de Resíduos dedicados à reciclagem dos OAU têm evoluído positivamente na operacionalidade da recolha e que estão preparados para dar uma resposta positiva às necessidades de reciclagem existentes, principalmente às do setor doméstico, que apresenta baixos índices de reciclagem.
Tenho-me apercebido que o interesse do cidadão comum pela reciclagem dos OAU tem aumentado, talvez fruto da crescente comunicação e sensibilização dos municípios e dos próprios operadores, o que é um bom indicador para atingirmos índices de reciclagem altos.
Quais são os desafios que os recolhedores de óleos alimentares enfrentam atualmente?
No imediato, a criação de uma entidade gestora para os OAU é o tema que mais desafio parece criar no meio dos Operadores de Gestão de Resíduos, cuja principal atividade é a reciclagem dos OAU. Prevê-se que o mercado vá mudar, mas nós, operadores, sabemos muito pouco sobre o que aí vem. Até pode mudar para melhor, esperemos que sim.
Na minha opinião, há outro desafio que o nosso mercado enfrenta há alguns anos, que passa pela necessidade da revisão da legislação aplicável aos OAU de forma a simplificar toda a operação de reciclagem dos OAU. Tornar clara a classificação dos OAU, o processo de licenciamento, o processo de valorização, o transporte e o tratamento dos OAU, a fiscalização, a sensibilização, etc..
A meu ver, a simplificação trará mais exigência aos Operadores de Gestão de Resíduos, mas aumentará a profissionalização do setor. Só desta forma podemos ter um mercado concorrencial competitivo, mas justo e chegar a índices de reciclagem de OAU satisfatórios.
Acredita que existe, de alguma forma, um mercado paralelo no que à recolha de óleos alimentares diz respeito?
Existe, claramente, um mercado paralelo na recolha dos OAU. Este mercado vai continuar a existir enquanto a legislação não for alvo de uma revisão. Não quer dizer que uma revisão na legislação o faça desaparecer por completo, mas acredito que o minimize.
O mercado paralelo existe por diversos fatores:
– A legislação é demasiado permissiva. Por exemplo, prevê que qualquer cidadão coletado, sem qualquer tipo de licenciamento, possa recolher e transportar OAU para um Operador de Gestão de Resíduos. Esta figura é conhecida no nosso mercado como “recolhedor de OAU”. Há bons “recolhedores de OAU” que prestam um serviço cuidado, mas há outros que prestam um serviço tão mau (sujo, desorganizado, roubam OAU) que põem em causa a imagem de todos os intervenientes na cadeia, principalmente os Operadores de Gestão de Resíduos. Na minha opinião, estes intervenientes devem deixar de existir: ou se tornam em operadores de gestão de resíduos e podem recolher OAU ou, pura e simplesmente, não o podem fazer.
– Falta de sensibilização e fiscalização do produtor de OAU: as entidades competentes devem reforçar os deveres dos intervenientes da cadeia de reciclagem. Muitos dos produtores de OAU (do canal HORECA, por exemplo) desconhecem que são responsáveis pelo bom encaminhamento do resíduo. Não chega ter alguém que recolha o OAU! O produtor tem de assegurar-se que este tem o destino correto.
– Um dos fatores principais e talvez o mais grave: há Operadores de Gestão de Resíduos que compram OAU a “recolhedores de OAU” sem fatura, sem questionarem a sua origem e sem garantirem a rastreabilidade da cadeia de valor. Enquanto estes Operadores de Gestão de Resíduos continuarem a fazê-lo, o mercado paralelo vai sempre existir pois os OAU recolhidos indevidamente tem um destinatário final assegurado.
– Os sistemas de certificação, (como o ISCC – International Sustainability Carbon Certification, por exemplo) que existem para assegurar a sustentabilidade e rastreabilidade da cadeia de valor dos OAU, são facilmente “enganados” por serem muito permissivos e por estarem dependentes da boa-fé dos intervenientes.
Por forma a minimizar o mercado paralelo dos OAU, é urgente redefinir a legislação, aumentar a sensibilização e fiscalização.
Consulte o artigo em ABA – Associação de Bioenergia Avançada.